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Com fim do DPVAT seguradoras vão ganhar muito mais

Ao publicar no Diário Oficial o fim do DPVAT por Medida Provisória, o Governo Federal coloca em situação delicada as vítimas de trânsito mais humildes mas beneficia as grandes seguradoras que já vislumbram um mercado trilionário. A ideia que está por trás é terminar com um seguro que movimenta alguns bilhões e trocá-lo por um mercado de trilhões. Leia e entenda o que está por trás dessa MP.

O seguro social foi criado em 1974, na época do então presidente General Ernesto Geisel, para dar alguma proteção às pessoas mais pobres vítimas de acidente de trânsito. É um seguro singular porque protege todos os 210 milhões de brasileiros e não é necessário apurar quem é o culpado pelo acidente, nem mesmo se o proprietário do veículo estava em dia com o seguro.

Isto permite maior agilidade no pagamento de indenização, particularmente para os casos de morte, em que muitas vezes os familiares da vítima sofrem o drama da perda e com frequência perdem o apoio financeiro de quem sustenta a família.

O Governo diz que a extinção do DPVAT não desampara cidadãos em caso de acidentes, porque o país oferece “atendimento gratuito e universal na rede pública, por meio do SUS” e cobertura do auxílio-doença, aposentadoria por invalidez, auxílio-acidente e pensão por morte para segurados do INSS, além do Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas).

O SUS é responsável por prestar todo o atendimento médico necessário, enquanto o DPVAT garante indenização por dano corporal sofrido por um período de até três anos, seja por morte, com valor de R$ 13.500; por invalidez permanente, com pagamento de até R$ 13.500 a depender da gravidade da sequela; ou como reembolso de despesas médicas e suplementares, com valor que pode chegar a R$ 2.700.

O seguro da Previdência Social é totalmente diferente do DPVAT, porque o trabalhador tem que estar contribuindo com o INSS para ter direito. Num país com mais de 13 milhões de desempregados, quem estiver em atividade informal e não contribuir nem como autônomo, não terá acesso.

O BPC/Loas também tem cobertura restrita: o benefício no valor de um salário mínimo é pago a pessoas com deficiência de qualquer idade e a idosos a partir de 65 anos. Nos dois casos, é preciso ter renda mensal inferior a um quarto de salário mínimo (25%) por pessoa da família. Dessa forma, pessoas invalidadas em acidente de trânsito cuja renda familiar seja superior a R$ 249,50 por familiar não estão aptas a receber o benefício. Além disso, a população mais humilde sequer sabe como proceder para receber o BPC/Loas.

Não há dúvida que o seguro poderia ser aperfeiçoado, principalmente o combate às fraudes. Na maioria das vezes, praticadas por supostas vítimas ou advogados inescrupulosos que pegam procuração, às vezes da família do morto em pleno asfalto, com o corpo ainda quente, e depois ficam com o dinheiro ou deixam apenas uma parte com os familiares da vítima.

Mas a Medida Provisória não se justifica porque não havia urgência nem relevância, quanto mais para mudar um seguro social que existe há 45 anos, do dia para a noite, sem o necessário debate com a sociedade. Sequer foi apresentada uma alternativa para as vítimas. Pagar R$ 16,00 de DPVAT por ano para o proprietário de automóvel, ou R$ 26,00 para um ônibus, é absolutamente irrisório. Portanto, com exceção dos motociclistas que pagam quase R$ 90,00 por ano, a medida sequer serve para a demagogia política.

O Governo anuncia que dos R$ 8,9 bilhões disponíveis no caixa do DPVAT, R$ 4,2 bilhões serão utilizados para pagar indenizações entre 2020 e 2025, decorrentes dos acidentes que ocorrerem até 2019. Os R$ 4,7 bilhões restantes serão transferidos em três parcelas pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), para a Conta da União, em 2020, 2021 e 2022. Últimos anos do mandato do atual Governo.

É importante lembrar que os proprietários dos veículos pagam o DPVAT com finalidade específica. O dinheiro deve ser utilizado para pagar indenizações de vítimas, transferir recursos para o SUS e Denatran. Portanto, o Governo não tem o direito de usar esse dinheiro de outra forma. Mas quem se importa num país em que tudo vale e sempre valeu.

Ao mesmo tempo, o Governo informa que a população não ficará desprotegida mas não anuncia absolutamente nada novo, além dos direitos que a população já tem. Somente o SUS perderá mais de R$ 2 bilhões de recursos por ano. A SUSEP alega que são recursos irrelevantes, como se pudessem abrir mão de bilhões para atender às vítimas. Mas com certeza a falta desse dinheiro não vai ajudar a melhorar o atendimento nos hospitais. Naturalmente que a equipe do Governo não está preocupada com isso, afinal, vivem distante desse mundo de SUS e INSS. Usam seguro e previdência privada.

A SUSEP fala em liberdade econômica e de que o mercado vai criar alternativas. Embora admita que menos de 30% da frota brasileira esteja segurada. A alternativa que aparece no horizonte, não por acidente, é tornar obrigatório o atual opcional seguro privado de responsabilidade civil.

O custo dessa obrigatoriedade poderá passar o seguro dos atuais R$ 16,00 para centenas ou até milhares de reais por veículo. Um mercado de trilhões que deixa as grandes seguradoras, controladas pelos gulosos bancos e multinacionais, com os dedos inquietos na expectativa de contar os generosos lucros que vão obter.

Coincidência ou não, a Superintendente da SUSEP, Solange Vieira, em evento nesta terça-feira, diz que os motoristas têm de contratar coberturas de responsabilidade civil para cobrir os problemas causados a terceiros. Ela ainda afirmou: “Esperamos que aumente o número de motoristas que queiram contratar seguro”. Será que já começou a venda?

No caso das vítimas, ela acrescentou que é importante lembrar que a justiça pode sempre estabelecer uma indenização em casos de danos causados a terceiros. Mas a pergunta que não quer calar é: Será que as pessoas mais humildes que perderam um ente querido vão conseguir esperar a decisão da Justiça e receber o que tem direito num país que a impunidade é a regra?

Talvez tudo isso explique porque as grandes seguradoras ficaram caladas e não se manifestaram contra a medida. Elas sabem que trocam um mercado de poucos bilhões do DPVAT por outro de trilhões do seguro obrigatório de responsabilidade civil.

Tudo isso anunciado nesta semana em que domingo a ONU e o Brasil celebram o Dia Mundial em Memória das Vítimas de Trânsito. O que poderia ser uma triste ironia é apenas mais um passo na contramão do trânsito mais seguro e humano.

Para os que pensam que a questão é política é bom lembrar que vítima de trânsito não tem ideologia, acima de tudo tem família. E acidente não escolhe classe social, raça, idade, candidato em que votou, atinge a todos indiscriminadamente.

O drama maior é dos mais necessitados que ficarão completamente desamparados. Enquanto isso, as grandes seguradoras comemoram um mercado trilionário que vem por aí. Proprietários de veículos, protejam os bolsos, vão meter a mão no seu dinheiro.

 

Fonte: Estradas

Foto: Divulgação

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